quinta-feira, 8 de setembro de 2011

O silêncio da coisa que acabada



Vidas que se acabam a sorrir
Luzes que se apagam nada mais
e o que se foi não voltará jamais...


A diferença entre falar e escrever é que a percepção do significado das palavras ouvidas é diferente de sua visualização na impressão. O som não é apenas ouvido, mas também sentido o que ajuda compreensão de seu significado. Apesar disso um sistema de escrita é mais complexo do que o idioma falado, pois representa um conjunto de signos convencionados que conferem a possibilidade de entendimento daquela escrita.

Um sistema de escrita, ou simplesmente uma escrita, é um tipo de comunicação por símbolos chamados de caracteres ou grafemas, usados para registrar visualmente uma língua falada, com a principal da comunicação. Nesse sentido a escrita é uma representação gráfica e convencionada da linguagem, a sua interface. Tanto o idioma como a escrita são mutáveis, mas em dias de trocas estruturais intensas no linguagear da Internet o sistema da escrita pode ter diferentes representações e convenções que não se conectam mais ao todo da base fixa.

Uma forma devastadora de violência é a que se pratica passivamente ao não se preservar os idiomas e as escritas ao se aceitar uma monogamia cultural. Despir as minorias da sua própria identidade falante é promover o seu desaparecimento. Os que estudam o assunto acreditam que das 6 800 línguas vivas podem desaparecer 3 400 até 2010. A cada língua que se fecha acaba, também, a sua estrutura de escrita, por rudimentar que seja, é toda a memória que teríamos de um povo. Das mais de três mil línguas indígenas que existiam Brasil na época dos colonizadores, a metade na regiões amazônicas, hoje restam cerca de 150 línguas na região. A condição oral e escrita de uma língua é essencial registra uma dada cultura, assim como, determinar a maneira de como seus habitantes percebem o mundo e interagem com ele.

Ao se encerrar uma língua perde-se para sempre o saber, os hábitos, o conhecimento de um povo. Apagam seu imaginário, as condições espirituais e as suas lendas e mitos. Toda a sabedoria que esta nação teria guardado sobre a natureza e sua interação com ela. Fecha-se, para sempre, uma porta. Estas são luzes que se apagam para sempre e jamais renascerão em outros corações. Há o relato peculiar de fechamento de uma língua indígena que vale contar:

O caso nos chega através de Friedrich Alexander von Humboldt, naturalista alemão, explorador, filosofo e lingüista. Em 1804, o explorador Humboldt voltou de sua expedição de cinco anos a América Central e do Sul, trazendo consigo uma transcrição de 40 palavras ditas por um papagaio que se acreditava ser o último falante de uma língua extinta. Sua expedição foi na região do rio Orenoco, na Amazônia venezuelana, em região perto dos índios Atures inimigos dos índios Maipures. Apesar disso, em determinado momento da viagem, chegaram à aldeia dos índios Atures e descobriram que ela havia sido incendiada até os seus alicerces pelos agressivos. Buscaram e buscaram, mas não havia qualquer sobrevivente. Só encontraram um aturdido papagaio de cores brilhantes, entre as ruínas e que solene repetia uma e outra vez longos discursos numa língua incompreensível. Era a língua dos Atures, mas não restava mais ninguém que a entendesse.

O silencio do conhecimento é o silêncio da desarmonia criada no mundo quando se fecha uma lìngua e sua escrita.

Aldo de A Barreto

Language statistics & facts
http://www.vistawide.com/languages/language_statistics.htm
De volta ao Orinoco, seguindo von Humboldt
http://www.comciencia.br/comciencia/handler.php?section=8&edicao=14&id=132

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