quarta-feira, 18 de julho de 2012




“Malogramos sempre ao falar do que amamos”

A estrutura de texto escrito é uma construção e desconstrução de palavras colocadas e deslocadas. Uma estrutura de termos que é pensada como elementos que se unem e formam um todo ordenado e com princípios lógicos, com coerência de raciocínio e de ideias. A narrativa, assim, possui características estruturais de uma escrita que admite análise das suas particularidades, do viés de sua estrutura. É na nuance que um autor deixa a pista do que quer nos revelar.

Nas palavras de Borges: “as palavras começam, em certo sentido, como mágica ... Associando ao traço visível à coisa invisível, a coisa ausente”. As palavras nos significam e nos definem e identificam.  Como em “Malogramos sempre ao falar do que amamos”, originalmente destinado a um colóquio sobre Stendhal em Milão  foi o último trabalho de Roland Barthes. O autor depois de escrever seus textos os datilografava, fazendo pequenas alterações de palavras. Barthes começa “Malogramos sempre ao falar do que amamos” narrando um episódio imaginário acontecido na estação de trem de Milão. Da plataforma, numa noite fria e cinzenta, ele vê partir um trem destinado à cidade de Lecce.  Ele se imagina viajando para lá até o amanhecer; vê a luz, a doçura e calma fantasiadas. Saído do transe  logo se lembra de parodiar Stendhal: “Então eu vou ver essa bela Itália!  Como ainda sou louco nesta minha idade!”  E acrescenta uma frase que lembra os que não conseguem ter o seu amor correspondido: “Porque a bela Itália está sempre longe, noutra parte”.

Temos frequentemente o sentimento que falhamos ao querer nosso amor correspondido em diversos contextos que de nossa vida. A  bela Itália está sempre tão longe e repetidamente em outra parte.  Aos que se afligem com  estes “amores não correspondidos” deixo como recado as palavras de Sêneca, o filósofo que no ano 41 da era cristã perdeu tudo: amores, amigos, a carreira política e foi desterrado para local ermo na Córsega:

“Jamais confiei na fortuna. Todas as bênçãos que ela derramou sobre mim – riqueza e prestígio – releguei de tal maneira que ela sempre pode retomá-las sem me causar aflição. Mantive sempre grande distância entre ela e seus favores.  A fortuna apenas tirou-me o que me havia concedido, portanto, nada levou de mim.”

Aldo de A Barreto

Texto simplificado e revisto da postagem de 2010, “Palavras, palavras soltas, deslocadas”

Imagem do Projeto Twins da Irlanda

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